CENTRO DE CONVIVÊNCIA DE AFÁSICOS (CCA)
O CENTRO DE CONVIVÊNCIA DE AFÁSICOS (CCA) foi
criado ao final dos anos 1980 por iniciativa de alguns pesquisadores do
Departamento de Linguística (Instituto de Estudos da Linguagem) e de Neurologia
(Faculdade de Medicina), ambos da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP):
Benito Damasceno, Maria Irma Hadler Coudry e Edwiges Morato . O intuito da
criação do CCA foi desmedicalizar a abordagem das afasias e abrir
possibilidades de estudos (neuro)linguísticos num contexto de práticas sociais
e discursivas as mais diversas. (COUDRY, 1997, 2002; MORATO, 2001, 2007;
MORATO et al., 2002;). Foi também objetivo do CCA o estabelecimento
de um espaço de reflexão entre pesquisadores e afásicos e seus familiares em
torno dos impactos psicossociais da afasia (MORATO, 2007). Ao longo do tempo,
muitos foram os estudantes e pesquisadores da área dos estudos
neurolinguísticos e neuropsicológicos que tomaram contato com o CCA; muitos
foram os indivíduos afásicos que passaram e que passam pelos diferentes grupos
de convívio que se criaram a partir dos anos 2000, sob responsabilidade de
docentes da área de Neurolinguística do Instituto de Estudos da Linguagem.
Sediado no Instituto de Estudos da Linguagem
(Unicamp), onde ganhou um espaço físico próprio em 1998, o CCA reúne pessoas
afásicas e não afásicas que procuram enfrentar com ação social e pesquisa
acadêmica os desafios (interacionais, pessoais, sociais, econômicos, etc.) que
se apresentam para as pessoas que passam a conviver com as afasias.
O CCA, de acordo com Morato (2007, 2010), pode ser
compreendido como um espaço de interação entre pessoas afásicas e não afásicas
no qual se realizam atividades interacionais as mais diversas (também chamadas
de Programas ou Oficinas) que procuram evocar rotinas significativas de vida em
sociedade (conversação cotidiana, debates sobre temas de interesse comum,
jogos, cinema, cafés coletivos, visitas a exposições, piqueniques, saraus
musicais, etc.) e atividades que envolvem expressão artística (música, teatro,
dança). Temos procurado nessas práticas a restituição de papéis sociais, a
partilha de um espaço simbólico de experiências, o fortalecimento de quadros
interativos, a evocação de práticas discursivas as mais diversas, a
reorganização linguístico-cognitiva após o comprometimento neurológico, a recomposição
de aspectos ligados à subjetividade e à inserção social (MORATO et al, 2002;
MORATO, 2010). Constituindo-se como uma “comunidade de práticas” (ECKERT,
1997), esse grupo tem se responsabilizado pela elaboração e publicação de um
livro de divulgação sobre as afasias e os afásicos (MORATO et al., 2002), pela
edição de uma peça radiofônica (CALLIGARIS, 2016) e por um jornal anual desde
2007 (“Jornal do CCA”), distribuído gratuitamente. Os impactos teóricos,
metodológicos e sociais do CCA colocam em evidência as vantagens teóricas e
práticas da inter-relação entre estudos do campo das Neurociências e os da
Linguística para o campo da Saúde. Dentre eles, podemos apontar: questionamento
do escopo do termo afasia (fenômeno não redutível à carência metalinguística);
aumento da qualidade da recepção social das afasias (por meio de livro de
divulgação das afasias elaborado por participantes do grupo acima referido, do
“Jornal do CCA”, das atividades desenvolvidas dentro e fora da instituição);
apoio à formação de novos grupos de convivência de pessoas afásicas, etc.
O enfraquecimento dos suportes coletivos está,
segundo as perspectivas sociológicas mais atuais, fortemente relacionado a
exclusão social (BAUMANN, 1996; CASTELLS, 1995). O CCA encontra sua vocação potencialmente
inclusiva ao associar pesquisa acadêmica com ações que procuram enfrentar o
preconceito linguístico, o isolamento social e a subtração da pessoa afásica
das esferas públicas - aí incluindo especialmente o mundo do trabalho.
O CCA não deixa, assim, de ser terapêutico, no
sentido em que as relações humanas podem ter um efeito terapêutico; ou no
sentido em que o reconhecimento dos rituais sociais - a empatia, a amizade, a
ação conjunta, a reflexão - podem ser terapêuticos” (Fonte: MORATO et al., 2002;
MORATO, 2007).
Referências:
BAUMANN,
G. Contesting Culture: Discourses of Identity in Multi-ethnic
London. Cambridge University Press, 1996.
CALLIGARIS,
J. P. A dimensão
multissemiótica do jogo teatral : a experiência de elaboração de uma peça radiofônica no
Programa de Expressão Teatral do Centro de Convivência de Afásicos (CCA -
IEL/UNICAMP). Dissertação (mestrado). Instituto de Estudos da Linguagem,
Universidade Estadual de Campinas, 2016. Disponível em: <A dimensão multissemiótica do jogo teatral: a experiência de elaboração de uma peça radiofônica no Programa de Expressão Teatral do Centro de Convivência de Afásicos (CCA - IEL/UNICAMP).>. Acesso em 12 jun.
2018.
CASTELLS, M. La ciudad informacional: tecnologías
de la información, reestructuración económica y el proceso urbano-regional,
Alianza Editorial, Madrid, 1995.
COUDRY,
M. I. H. 10 anos de Neurolinguística no IEL. Cadernos de Estudos
Lingüísticos (UNICAMP), 32, 9-23, 1997.
________. Cadernos
de Estudos Lingüísticos (UNICAMP),42, p. 99-129, 2002